sexta-feira, 3 de julho de 2015


"...O auge intelectual da minha carreira tinha sido a redação da tese e a publicação do livro; tudo isso acontecera há mais de dez anos. Auge intelectual? Auge apenas? Em todo o caso, nesse tempo sentia-me justificado. Desde então não produzira mais nada, excepto pequenos artigos para o Journal des Dix-Neuvièmistes e às vezes, mais raramente, para o Magazine Littéraire, quando havia algum assunto actual ligado à área da minha especialidade. Eram artigos claros, incisivos, brilhantes; sendo geralmente bem aceites, tanto mais que eu nunca me atrasava a enviá-los para publicação. Mas seria o bastante para justificar uma vida? E em que é que uma vida precisava de ser justificada? A totalidade dos animais, a esmagadora maioria dos homens, todos vivem sem nunca sentir a mais pequena necessidade de justificação. Vivem porque vivem, sem mais, e e assim que pensam; suponho que em seguida morrem porque morrem, e que, para eles, não há mais nada a analisar..."

"Submissão" de Michel Houellebecq, Ed. Alfaguara, Lisboa, 2015, pág. 45.